Gelo de Verão
Põe-se o Sol a poente do sítio onde estou. Sopra a brisa de um Vento que me acena, num fim de tarde de Verão pintado a cores de cinza, num adeus breve a um astro que flameja.
Dou por mim debruçando-me sobre mim mesmo, naquele mesmo abismo onde caí, no Ocaso de um dia, aquele em que as cores se perderam e os calores se tornaram mais gélidos que um toque do Árctico.
Tocam os sinos a Ocidente, talvez o Ocidente claro da minha vida, aquela em que as virtudes e façanhas ocupam as memórias do que foi e não meramente os trilhos do que é hoje a minha singela história, escrita em papiros que as minhas lágrimas dissolvem no toque. Tentei, perceber-Me no Sol do Adeus, mas até aí me vi confrontado com as mil e umas tristezas tatuadas que trago todos os dias, no meu doce silêncio das coisas e na minha, tão minha, disfémica dor, que teima em ficar cravada nos dedos e no olhar.
Percebi-me nas cores do meu céu, perdido por metas, perdido por Mim, perdido de tantos e tantos pormenores que não me habitam, perdido de nexo e causalidade e até perdido no sentir. Aqueles pequenos pormenores que nos definem estão gélidos como gelos de um Verão, em que digo adeus ao Porto e adeus à vida do Passado, não receando a mudança antes pensando-a e esperando-a. Na volta do vento que me toca, as lágrimas gelam como estalactites numa qualquer gruta e encontro-me, ali, perdido e só, olhando o mar engolir o Sol como a vida me vai engolindo nos dias.
Os candeeiros das ruas que passo piscam incandescentes como que dotados de uma intermitência inexplicável. Aquela mesma intermitência que não explico, mas que me explica os gestos, os sentires e quem sabe o porquê de umas mucosas tão arduamente trabalhadoras em momento que haviam sido pensados para a glória da conquista. O que fazemos quando nos olhamos no espelho e vemos apenas a réstea mais ingreme daquilo que nos sonhamos? O que devemos pensar? A Verdade daquilo que é ou simplificar o pensar idealizando mil eufemismos para tornar mais fácil o sentir? Sábia mente é aquela que sabe moderar aquilo que a habita, limitando com isso o sentir, mas hoje sinto-me mais ignóbil e imbecil do que qualquer outro ser não pensante que nos aflorar na mente.
Parti os jarros de Mim. Deitei-os fora. Aqueles pedaços que temos em nós e conseguimos reconhecer neles aquela pontinha de especialidade que nos habita. Partiu-se! Foi-se!
Hoje sou-me como uma bomba relógio... Prestes a explodir, na inexorabilidade fatal de um dia que chega ao fim, como um soldado que se esconde debaixo de uma ponte prestes a explodir ou aqueles homens numa gruta sem saída. Haverá saída quando não percebemos a entrada? Haverão caminhos a percorrer, quando não temos meios para? Haverá lógica quando a perdemos demasiado em panos e tecidos que não são mais os nossos?
Demasiada estrela, demasiada luz, demasiada chama...
... em tamanho sofrimento e dor que me devora, todos os dias, ao acordar, ao ser, e ao dormir.
Apenas eu, Hugo!
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