Sunday, September 25, 2005

Rouba-me


Ouço, impávido e sereno, o tilintar cruel dos ponteiros do relógio. Ouço, numa bruma desmedida, as pessoas que se vivem e se sentem, por entre uma manhã de um mês qualquer, de um ano por inventar, de uma cidade qualquer. Escuto o ruidoso barulho do meu silêncio e perpetuo-me numa palpitação do meu musculo cardíaco. Sinto-Me... Vejo-Me... e sou por momentos Rei de um Mundo por inventar...
Habito os meus momentos de solidão como um vagabundo habita um lugar qualquer. Vagueio nas minhas cogitações até um Além longínquo, onde a Razão perde o nexo e a Causalidade não passa de uma relação utópica. Será que um dia tranformarei a Razão Utópica na Razão Vivida e Sentida?

Vivo-me por entre as Sombras de um castanheiro velho, que teima em fazer-me sombra. Ali onde ele habitava, fui feliz por nada saber, contente por tudo desejar, e sou ainda desejoso por obter aquilo que ainda não tenho. A longevidade do Castanheiro inveja-me. Consegue estar só, imponente, vivendo aquilo que a Natureza lhe dá sem arrependimento, dor ou comentário. Ao invés, eu habito-me no silêncio bradando aos Céus e procurando respostas para os mais complicados enigmas e tristezas. Vivo perpetado num clima de angústia que me fere os olhos, me cega a lucidez e me condena a ficar atrás de grades de dor. Não consigo ficar estático face ao que a Vida me dá. Esgana-me o silêncio, molesta-me a ausência, aumenta-me os cabelos brancos e põe-me rugas na silhueta.

O velho Castanheiro vive-se a ele próprio. Habita-se a ele próprio. É feliz porque existe simplesmente, sem pensar, sem querer, sem preocupações. Invejo-o por isso. Não tem o estigma de viver pensando se conseguirá ser alguém, se conseguirá obter respostas para o Mistério daquilo que sente, daquilo por que passa e da Razão que o faz estar ali, parado, imune ao passar do tempo e das pessoas que o rodeiam.
Enclausuro-me no Meu Mundo querendo que dele me roubes. Me venhas habitar, roubar-me, tirar-me do adiamento sistemático da Felicidade e A precipites como um fútil estalar dos dedos. Sim, onde a Vida perder o Mistério ganha a Felicidade o seu significado. Gostaria de percorrer os trilhos de uma Razão. Alcançar na mácula, a vivência eterna e ser por momentos o Imperador da Existência, o Imperador da Tua Existência.
As amarras, que me amordaçam os sentidos, vão-se esbatendo e rompendo lentamente como um dia que segue o seu caminho rumo ao seu fim - a Noite. Luto contra elas como um General de guerra que quer levar de vencida a sua batalha. Talvez no dia em que for capaz de as derrotar seja o mais feliz dos lutadores, porque chegou, viu, não venceu, mas lutou para isso ter acontecido.
Beijei-me a mim próprio quando me vi no espelho. Não porque os pensamentos de Narciso me infestaram, antes porque sei que um dia será outra pessoa a beijar-me, por entre as manhãs, tardes e noites de meses e meses a fio. No Ocaso da Vida estarei aí feliz, completo e uno com essa pessoa, habitando a essência do Ser.
Por agora, tento-me viver...
Apenas eu, Hugo!

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